segunda-feira, 27 de outubro de 2014

Em busca do paraíso

     Era uma vez um grupo de pessoas nômades. Eles viviam durante anos em uma grande floresta. Se abrigavam próximo de grandes árvores frutíferas, donde extraíam os alimentos e conseguiam madeira. Quando acabavam os frutos, o homem mais forte do grupo subia na árvore mais alta. Nem sempre ele aguentava o esforço da subida, pois podia escorregar, um galho podia cair, poderia esbarrar em um ninho de pássaros... Enfim, havia muitos obstáculos. Uma vez no topo da árvore, o aventureiro olhava o horizonte a procura de outra grande árvore frutífera.
       Essas árvores eram tão altas que, de cima não se conseguia estimar quão longe estavam da próxima árvore. Tudo o que podia fazer era descobrir a direção. Ao a conhecerem, as pessoas caminhavam, muitas vezes durante dias, até a árvore que fora avistada.
        Novamente, os frutos da árvore da qual esse grupo colhia o alimento começou a se esgotar. Houve uma reunião de todas as pessoas para decidirem quem seria o próximo a subir na árvore. Eis que uma mulher disse:
       - Passo muito tempo observando a natureza, e percebi que alguns arbustos dão frutos de tempos em tempos. Há um período de flores e há um período de frutos. Ainda temos algumas frutas para colhermos. Temos alimento para vários dias, talvez semanas. Se fizermos um racionamento de alimentos, poderemos esperar até os arbustos que acabaram de perder as flores darem frutos.
        Outra pessoa disse:
      - Mas e se não tivermos alimento o suficiente até a próxima frutificação? Não teríamos alimento para irmos até a próxima grande árvore.
       - Já pensei nisso. Alguns caçadores já viram algumas árvores frutíferas em suas caçadas não muito longe daqui. Poderíamos nos alimentar delas também. Assim tenho certeza que teríamos tempo.
         - Não é muito arriscado?
        - Acho que vale a pena corrermos o risco. Também a caminhada até a próxima grande árvore pode ser muito longa e cansativa. Muitos morrem no caminho. Se minha ideia der certo, não correremos mais  esses riscos.
       Todos do grupo estavam desconfiados com a nova ideia. Resolveram que iriam pensar melhor e se reuniriam na próxima noite.
        Todos se reuniram novamente. Foram realizadas diversas discussões, e, por fim, se realizou uma votação. Por poucos votos, resolveram apostar na nova ideia. Estavam dispostos a assumirem esse risco. Um risco por uma vida melhor.
        Assim se passaram vários dias fazendo o racionamento. Com fome, algumas pessoas começaram a pensar que não foi uma boa ideia.
          Eis que certo dia uma pessoa disse:
        - Amigos, estamos passando fome por essa decisão incorreta. Vamos morrer de fome se continuarmos assim! Contudo, durante este tempo estive pensando em uma solução e me lembrei de que sempre que mudamos de lugar vamos para outro com mais frutas.  Se continuarmos fazendo isso, conseguiremos chegar em um ambiente com tantas árvores frutíferas que não precisaremos mais mudar de lugar em busca de um melhor. Mas vai demorar muito até conseguirmos.
      - Mas como é possível haver tantas frutas que não irão acabar?
      - Ora, as frutas só acabaram nos lugares onde estivemos, pois há pessoas que estão pegando a mais e escondendo. Sem essas pessoas, teríamos muitas frutas a mais para serem repartidas até que novos frutos surgissem. Isso se repete sempre. Na verdade, está acontecendo agora. As pessoas que dizem que devemos insistir na ideia de ficarmos aqui são essas pessoas más. Elas guardaram alimentos só para elas sobreviverem.
       Houve um grande murmúrio entre as pessoas do grupo. O ideólogo continuou:
      - Mas eu descobri a solução para isso. Eu irei guiá-los para o lugar em que nunca passaremos fome.
      - Como? Algum de nossos deuses o iluminou?
      - Não existem deuses. O que existe é o homem e a natureza. O homem usa a natureza para atingir seus fins. Contudo sempre fizemos isso de forma aleatória, sem lógica. Na verdade, não é preciso que nosso melhor homem suba na árvore mais alta. Andei investigando e percebi que essa árvore possui uma seiva especial. Quando o homem sobe na árvore, ele entra em contato com essa seiva durante a subida, e o efeito deste contado é a possibilidade de ver a próxima árvore. Mas a visão é limitada, ele não consegue avistar o lugar onde não passaremos fome, apenas consegue ver a direção da próxima grande árvore.
      - E o que faremos?
     - Eu sei o que faremos. A pessoa que sobe não consegue ver longe pois não esteve em contato com  a seiva por tempo o suficiente, ele estava em um caminho até a perfeição, embora não a atingisse. Para alguém atingir a perfeição será preciso de muito contato. Iremos extrair a seiva da árvore até conseguirmos um grande pote cheio. Então eu me disponho a ficar mergulhado na seiva por várias horas, até dias. Assim, atingirei o estágio do novo homem. E então irei guiá-los para o local repleto de frutas.
      E assim fizeram. O lunático ficou mergulhado por um dia inteiro. No começo, várias pessoas viam ele  como um lutador em seu nobre propósito. Olhavam para ele da mesma forma que olhavam para as chamas da fogueira à noite: com um olhar de adoração a algo mágico e luminoso. Mas isso só durou algumas horas. Logo as pessoas que ficavam perto começaram a se sentir estranhas, vendo alguns mosquitinhos brilhantes voando, embora nunca o conseguissem acertar. Também seus olhos começavam a se encher de lágrimas e a visão ficava turva. Então resolviam dar uma volta e ficavam mais afastadas. Logo retornavam os mosquitinhos sumiam, a visão voltava ao normal.
      Em plena noite, o grupo houve uma gargalhada. Para alguns, soava de forma assustadora. Foram todos ver o que havia acontecido. Era homem mergulhado na seiva que ria. Perguntaram o que havia acontecido. Ele disse que já podia ver o caminho até a perfeição.
     Muitos do grupo de alegraram. Outros acharam que ele havia enlouquecido.
      O grupo então se dividiu em dois: 1) aqueles que permaneceriam, pois havia indícios que a estação dos frutos estava quase chegando; e 2) aqueles que partiriam.
     O sujeito que iria guiar o grupo em busca da terra perfeita não estava parecendo muito bem. Perguntaram se ele tinha algum problema, se queria ficar por mais algum tempo para descansar. Ele respondeu:
      - Não se preocupem. A visão do mundo perfeito tem um custo. Não consigo mais enxergar as coisas com nitidez. Mas isso só acontece enquanto estiver longe do paraíso. Quando me aproximar, minha visão irá voltar ao normal, na verdade ficará melhor do que jamais esteve. Partiremos amanhã de manhã.
     Uma das pessoas que iriam ficar disse:
      - Iremos nos separar em dois grupos, é justo que levem com vocês parte da comida para a viagem.
      O líder respondeu:
     - Não queremos nada que vocês têm a nos oferecer. Estão guardando a melhor parte e nos dando as comidas envenenadas. Estão nos dando maçãs podres que irão apodrecer todas as demais como uma praga. Vamos partir sem nada que vocês poderiam nos dar!
      No outro dia, o grupo partiu. Não mais queriam se arriscar por uma vida "melhor". Queriam a certeza de um mundo perfeito. Durante o caminho, o líder tropeçava várias vezes e se localizava com certa dificuldade. Pararam no meio do dia com fome. O líder disse:
      - Para nossa jornada, precisaremos de comida. Mas não há comida por perto. Então vou enviar cinco de vocês de volta para pegarem de volta a comida que os outros não nos deixaram levar.
      - Mas eles não nos haviam oferecido?
     - Haviam nos oferecido frutas podres. Temos direito às frutas boas, pois eles escondem entre eles as boas. Por isso, quero que vão lá e peguem à força as frutas boas.
      O pequeno grupo então se dividiu, um dos grupos voltou para pegar as frutas, e o segundo esperou. Na manhã seguinte os dois subgrupos se reencontraram e comeram. Então retornaram à viagem. Eis que chegaram em um deserto. O líder continuou andando. O grupo que o seguia perguntou:
      - Está nos levando para um deserto!
     - Ele é um obstáculo necessário para atingirmos o paraíso. Se fosse fácil atingir o estado perfeito, não iriam todos para lá? E continuou a caminhada.
      Alguns infiéis caminharam mais um pouco, mas mudaram de ideia e resolveram voltar. Disseram que ele estava louco. Esses infiéis retornaram ao antigo grupo. Alguns morreram no caminho.

     O grupo dos fiéis ao líder continuaram a segui-lo. Pessoas desse grupo morriam, outras nasciam. Certa vez o grande profeta estava prestes a morrer. Ele passou para uma pessoa que o iria suceder uma fruta, a fruta da árvore cuja seiva ele usou. Disse que era para comer a fruta, que ela daria a quem comesse a visão do caminho para o paraíso. Morreu. O que o sucedeu comeu a fruta e teve os mesmos privilégios videntes que ele. Embora a nitidez fosse menor, ele podia ver o caminho que levava ao paraíso. E continuou guiando o grupo cruzando vários desertos rumo ao paraíso na terra.



Tenham um bom dia!


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