sexta-feira, 31 de janeiro de 2014

[feminismo] parte 3 - Biologia e Capitalismo

Biologia
     Não ia adicionar esse tópico, mas ele me parece apropriado. Por mais que se diga em igualdade entre sexos, ela se aplica mais à política do que à biologia.
     Há exceções, mas há diferenças fisiológicas entre homem e mulher. A cultura não consegue eliminar essas diferenças, embora possa minimizá-las e combater o preconceito.

     As mulheres conseguem dar um bebê à luz, produzem hormônios diferentes, acumulam a gordura de forma diferente, sentem mais frio (http://saude.terra.com.br/mulheres-sentem-mais-frio-que-os-homens-descubra,92888c3d10f27310VgnCLD100000bbcceb0aRCRD.html) e possuem outra série de diferenças - muitas delas podem ser minimizadas pela cultura.
     

Capitalismo
     Grande parte das feministas também criticam o sistema capitalista. Não vou me adentrar nos motivos. Creio, contudo, que não seja exatamente uma crítica própria.
     Em primeiro lugar, o capitalismo se caracteriza (ou se define, dependendo de sua definição) pela divisão do trabalho e pela liberdade de mercado.
     A entrada de mulheres no mercado de trabalho fortalece essas duas características do capitalismo. Mais pessoas buscando trabalhos, comprando e consumindo é bom para o mercado.
     Uma maneira simples de se perguntar se o lucro dos capitalistas pode ser bom é fazer a seguinte linha de pensamento: As mulheres (como indivíduos, não como grupo holístico) realizam  muitos trabalhos melhor do que os homens? Se sim, elas deviam ser empregadas. Se os empregadores são sexistas e não querem empregadoras mulheres, então eles estão preferindo seguir suas ideologias do que buscar o lucro. A consciência de que se pode lucrar mais ao empregar mulheres deixa tanto os capitalistas quanto as feministas satisfeitos.
     Historicamente, o capitalismo também deu vários passos em direção da igualdade. Por exemplo, o emprego de mulheres (e crianças, "não se esqueçam das crianças", mas fica para outro dia) em fábricas. Por mais que a situação fosse desumana (não só para mulheres, mas, como o termo diz, para qualquer ser humano), foi uma conquista, ou não?
     Ainda assim as mulheres tinham muito tempo para trabalhar, então pouco sobrava para o ócio criativo, não havia tempo para se reunirem, discutirem, criticarem. Eis que o capitalismo trouxe equipamentos que otimizam o tempo, como a máquina de lavar. 

Caso tenham dúvidas, questionamentos, críticas, comentários, sinta-se à vontade.


Tenham um bom dia!

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Postagens anteriores:
http://copaziodesaber.blogspot.com.br/2014/01/feminismo-parte-2-liberalismo.html
http://copaziodesaber.blogspot.com.br/2014/01/feminismo-parte-1-cristianismo.html

Indicação
Guia politicamente incorreto da filosofia - Pondé

domingo, 26 de janeiro de 2014

[feminismo] parte 2 - Liberalismo

Liberalismo
     É comum atribuir ideias a favor das mulheres à esquerda política. Farei uma defesa do liberalismo, que é de direita (embora alguns considerem de centro).
     Os liberais defendem a liberdade de cada indivíduo fazer o que quiser desde que não interfira a liberdade do outro.
     Grande parte dos liberais defende a liberdade do aborto. O direito à propriedade se inicia no próprio corpo. É direito da mulher a decisão de abortar ou não. Moralmente se pode condenar, mas não legalmente.
     Para os liberais, o mercado deve ser acessível a todos, homens ou mulheres. Se há uma mulher que trabalha melhor que outro homem em um determinado emprego, não há sentido em se impedir essa mulher de trabalhar. Mas também vale o contrário. Não se deve estabelecer cotas ou privilégios.
     Salários desproporcionais, desequilíbrio numérico entre homens e mulheres e outros problemas podem ser resolvidos naturalmente - ou atingir um equilíbrio em que ambos fiquem (na medida do possível e do útil) felizes - se houver o livre mercado. Quem está recebendo menos poderia facilmente trocar de emprego para um que receba mais pelo seu serviço.
     Existe uma diferença entre defender o direito das mulheres por elas serem minoria (pobrezinho das minorias, elas precisam de ajuda) e defendê-lo em nome da igualdade.
     Os liberais defendem a liberdade das mulheres trabalharem no que quiserem sem preconceitos, mas isso não deveria ser imposto pelo Leviathan por meio de políticas de cotas, por exemplo. O modo correto de se alcançar essa liberdade é pelo esforço de cada indivíduo e pela conscientização (não necessariamente realizada pelo governo) de que o preconceito contra elas é injustificado e negativo.


Tenham um bom dia!


Links recomendados:


Vídeo recomendado para não feministas

Vídeo que mostra um ponto de vista próximo (o autor do vídeo não é liberal, mas pensa parecido nesse aspecto)

quinta-feira, 23 de janeiro de 2014

[Feminismo] Parte 1 - Cristianismo

     Olá, vou expor alguns pontos que vale a pena se considerar na próxima reflexão sobre o feminismo. O primeiro da série é sobre o Cristianismo, um assunto meio polêmico. Boa leitura.

Cristianismo
     Começando pelo ponto muito criticado. Tive a felicidade de participar de uma discussão no Facebook sobre um vídeo que compartilhei (http://www.youtube.com/watch?v=1w6Fo8FD4RQ&hd=1). Nele, os católicos resistem pacificamente a uma tentativa feminista de invasão da igreja. Digo "feminista" pois as manifestantes se diziam feministas e participavam de uma reunião feminista. Mas de modo algum pretendo criticar o feminismo como um todo.
     Nessa discussão, a Igreja Católica foi atacada. Vou expor uma pequena observação. Não pretendo aqui dizer que toda feminista deva louvar o cristianismo. Mas, se criticam o Cristianismo pelo suposto mal que fez (a Santa Inquisição), então creio que se possa defender o Cristianismo pelas coisas boas que fez - o que nunca é posto em discussão. Isso seria um pensamento lógico, mas a cultura do duplipensar não liga muito para lógica. Sobra-me, então, fé de que as palavras abaixo serão ouvidas por alguma boa alma.

     A cultura antiga (e as maioria esmagadora das religiões) desvalorizam totalmente a mulher. Podemos citar a Grécia antiga (pesquise por Aristóteles), Roma, China, Índia etc. Exemplos não faltam, pergunte às feministas.
     Eis que cito o judaísmo, muito importante por diversos motivos. Vamos citar passagens da lei mosaica:
Gn 1, 27-28 "Deus criou o homem à sua imagem, criou-o à imagem de Deus, criou o homem e a mulher. Deus os abençoou: 'Frutificai, disse Ele, e multiplicai-vos, enchei a terra e submetei-a. Dominai sobre os peixes do mar, sobre as aves dos céus e sobre todos os animais que se arrastam sobre a terra' ". Observa-se aqui uma posição de igualdade entre homem e mulher. Deus não se dirigia exclusivamente ao homem nem à mulher, mas a ambos em sua fala.
Gn 2, 22-23 "E da costela que tinha tomado do homem, o Senhor Deus fez uma mulher e levou-a para junto do homem. 'Eis agora aqui, disse o homem, o osso de meus ossos e a carne de minha carne; ela se chamará mulher, porque foi tomada do homem.' A passagem confirma a igualdade no sentido em que ambos são feitos da mesma substância.
    Pode ser que as passagens não sejam tão explícitas quanto à igualdade entre homem e mulher. Mas vamos ao advento do cristianismo. O que diz o Novo Evangelho?
Gl 3, 28 "Já não há judeu nem grego, nem escravo nem livre, nem homem nem mulher, pois todos vós dois um em Cristo Jesus"
1Co 7, 4 "A mulher não pode dispor de seu corpo: ele pertence ao seu marido. E da mesma forma o marido não pode dispor do seu corpo: ele pertence à sua esposa"
     São passagens que, segundo penso, dispensam comentários. Também citam Mt 5, 28; 1Co 6, 13-19; 1Co 7, 2; 1Tm 5; 1Sm 2, 6; Jo 1,21; mas não vou entrar em detalhes.
     Os evangelhos mostram que as mulheres tiveram um grande papel na vida de Cristo - assim defende Augusto Cury, para quem quiser se aprofundar. Enquanto a maioria (senão todos) os apóstolos não estavam ao lado de Jesus no momento em que ele morreu na cruz, ao seu lado estavam várias mulheres (Lc 23, 27-29) Elas estavam presentes quando Ele foi sepultado (Lc 23, 55). Elas quem foram até o túmulo de Jesus (Lc 24, 1-3 - em Lc 24, 10, cita o nome das três mulheres) - e não havia nenhum homem, as mulheres quem mais amavam o Cristo. Sem falar na passagem em que ela protege a mulher adúltera de ser apedrejada.

     O cristianismo abomina o aborto não por desvalorizar o corpo da mulher, mas pois toda vida é sagrada para essa religião. Um argumento utilitarista contra o aborto é que a proibição do aborto não permite que se aborte as filhas como muito se fez na China (e ainda se faz?).
     O catolicismo ensina a oração à Maria - por mais que não seja unânime no Cristianismo tal valorização da mãe de Deus.
     Ainda quanto ao catolicismo, há muitas santas. Há mulheres cujos exemplos devem ser seguidos. Para os interessados, ler o link indicado. Tem uma professora que apresenta diversas mulheres na história do Cristianismo que provam que o papel da mulher não era totalmente submisso. Havia mulheres que agiam de forma impensável para as mulheres da época, como morrer defendendo sua crença, buscando a castidade, ensinando e pregando. Mais tarde houve um aumento da rigidez, mas em vez de criticar essa rigidez, pode ser mais eficiente elogiar o comportamento das mulheres que muito ajudaram o Cristianismo devido à possibilidade de atuação ativa na vida religiosa.

     Feministas ainda podem criticar a Igreja atual. Por exemplo, pode-se criticar a posição quanto ao aborto. Contudo, não podem negar que o Cristianismo trouxe uma ideia de mulher muito diferente - e mais igualitária - do que muitas outras religiões (compare com a visão da mulher na China, nos países islâmicos e outros não cristãos). Corrijam-me os cristãos ou os feministas (ou as feministas se assim preferirem) se falei bobagem.
     Obs.: O fato de a Igreja ter uma visão diferente do papel do homem e da mulher não significa superioridade ou inferioridade. Se você não concorda com isso, não creio que haja uma opinião, seja a sua, seja a da Igreja, que seja indiscutível e incriticável. Se quiserem, mais tarde falo mais sobre esse ponto.


Tenham um bom dia!

Fontes:
http://www.napec.org/vida-crista/o-que-seria-das-mulheres-sem-o-cristianismo/
Bíblia

Indicação:
http://noticias.gospelprime.com.br/mulheres-excluidas-historia-cristianismo/

domingo, 19 de janeiro de 2014

Ainda sobre o "rolezinho"

     Em minha última postagem sobre o "rolezinho",  defendi a ideia de que há um coitadismo presente nos grupos que organizam.
     Link: http://copaziodesaber.blogspot.com.br/2014/01/rolezinho-e-apartheid.html

     Acontece que li algumas notícias que mostram que o coitadismo não está tão presente. O movimento é simplesmente de jovens querendo diversão, coisas de marca e de um lugar legal para estarem, e não um grupo de pequenos revolucionários descontentes com a situação do Brasil. Que decepção.
     Não sei se essas notícias dizem a verdade. Se for, peço mais uma vez perdão pelas críticas na última postagem sobre os "rolezinhos" e coloco minhas críticas de acordo com a nova interpretação.
     As supostas vítimas do capitalismo malvado não lançam mão do coitadismo. São os intelectuais e humanistas que os veem como coitadinhos sem que eles se vejam assim.
     Esses jovens jovens dos "rolezinhos", vítimas do capitalismo, clamam por mais capitalismo (já que desejam comprar produtos de marca em um shopping e aproveitar todas as regalias do capitalismo). Síndrome de Estocolmo (o que é Síndrome de Estocolmo? - veja link no final)? A situação é análoga aos jovens que saem às ruas criticando o Leviathan e cuja solução é mais poder ao Leviathan, mas com a diferença de eles não criticarem o capitalismo. Quem critica o capitalismo é o mesmo que dá aos jovens a alcunha de coitadinhos explorados pelo capitalismo.
      Há grupos que gostariam que os "rolezinhos" fossem uma manifestação de uma luta de classes ou de etnias ou sei lá do que. Um gosto meio estranho esse, na minha opinião, de querer ver luta e conflito. Seja ou não uma luta de classes, os grupos acham que são. Por achar que são, irão agir como se fosse. Daí o apoio desses grupos ao movimento. Um tiro no pé, se estiverem na verdade apoiando os jovens que querem produtos de marca - e quem não quer?

     Só para ocupar espaço, vou explicar, segundo essa teoria, como o processo ocorreu:
     Jovens combinam se reunir ao shopping - comprar, comer e se divertir. Como são muitos, e jovens, acabam fazendo baderna. A baderna seria menos prejudicial se não houvesse oportunistas de plantão. Esses oportunistas quem furtaram, por exemplo (ou pode ter sido os próprios jovens também). Os "caras" do shopping acharam perigoso e caótico o que estava acontecendo. Polícia. Intelectuais e humanistas (em uma generalização infeliz de minha parte) ficam com pena dos jovens e acreditam que a culpa é do capitalismo. Por que a culpa é do capitalismo? É preciso de algum caminho para chegar a essa conclusão. Ora, é uma luta de classes contra o capitalismo.

     Só quero dizer que nada justifica, para mim, alguns excessos por parte dos jovens.


Tenham uma boa noite!

Indicações
Síndrome de Estocolmo - http://pessoas.hsw.uol.com.br/sindrome-de-estocolmo.htm
Coluna do Reinaldo Azevedo - http://veja.abril.com.br/blog/reinaldo/geral/a-esquerda-boco-ja-esta-de-olho-no-rolezinho/
Coluna do Rodrigo Constantino - http://veja.abril.com.br/blog/rodrigo-constantino/cultura/os-rolezeiros-nao-querem-saber-de-luta-de-classes-marxista/

sábado, 18 de janeiro de 2014

Conceitos Holíticos

     O/a leitor/a deve estar se perguntando por que uso a expressão "classe X (seja lá o que isso signifique)" ou estruturas semelhantes. Aqui explico.

      Holítico - tendência do sistema de determinar o comportamento das partes. As partes só podem ser estudadas em sua relação com o todo, por exemplo, um relógio é maior do que a soma de suas engrenagens (ele exige ordem, interação etc.). O papel das engrenagens só pode ser compreendido em sua relação com o todo. De nada adianta saber a função das engrenagens para determinar a função de outra engrenagem, é preciso saber a relação dessa engrenagem com o relógio.
     Conceito holístico - O ser humano agrupa unidades em grupos (grupos artificiais, criados pela inteligência humana). Esses grupos são conceito holísticos. Ex.: Família, classe, casta, estamento, nação, povo, raça, etnia, por religião, por profissão, por nível na profissão etc.

     Na literatura, o conceito holístico lembra a ideia de metonímia, no sentido de o todo representando as partes. Exemplo:
     Sem metonímia - Pessoas da classe proletária devem se unir.
     Com metonímia - A classe proletária deve se unir.
     Um exemplo mais feliz: Edison ilumina a casa de todas as pessoas. Aqui, usa-se o nome do inventor da lâmpada em vez do objeto em si - inventor pela obra.

     Friedrich Müller defende que a ideia de "povo" pressupõe uma certa homogeneidade (escolhi esse autor para explicar o que é o "povo", mas há outros autores que explicam de forma diferente). Quando a população de um país não é um povo por ser muito diferente, o país passa a precisar de uma Constituição, de normas que sirvam para os diferentes. Aqueles que detêm o poder criam um "povo" imaginário. Não há povo, mas os detentores do poder querem uma legitimidade, e se dizem agir em nome do "povo". Esse "povo" é criado à imagem e semelhança dos poderosos - e não dos oprimidos.
     Imagine um político dizendo "A nação irá prosperar sobre meu regime. O povo terá liberdade e igualdade. As classes sociais terão suas vontades e desejos respeitados etc.". Basta substituir os conceitos holísticos por "eu" e entenderá o que Müller quis dizer.
     Qualquer conceito holístico pressupõe certa homogeneidade. O problema está em se empregar tais conceitos quando essa homogeneidade não existe. Nesses casos, o agente dá o significado ao termo conforme sua vontade.
     Exemplo: A cor da pele. Você pode separar as pessoas conforme a cor da pele, chamar um grupo de "branco" e outro de "negro". Até aí, o conceito holístico não apresenta problemas. Qualquer indivíduo no primeiro grupo será branco. O problema surge quando você atribui uma característica a um dos grupos que não é inerente aos indivíduos. Imagine que você observe que há mais indivíduos do grupo "branco" que sejam homens do que no grupo "negro". Se você disser que os indivíduos do grupo "branco" são brancos e homens, está cometendo um erro.
     Outro exemplo mais difícil é separar em "ricos" e "pobres" por uma medida arbitrária de dinheiro. Até esse momento, a divisão pode fazer sentido. Ao disser que o capitalismo é uma doutrina dos "ricos" pelo fato hipotético de a maioria dos "ricos" defenderem o capitalismo se está cometendo um erro. Mesmo que uma característica majoritária em um grupo tenha uma relação com o grupo, não significa que o grupo é homogêneo. Ao empregar um sentido diferente daquele usado na separação e sem vínculo necessário com o sentido original do grupo, se está cometendo um erro.
     Marx define o burguês como aquele que possui os meios de produção. O proletário não os possui. A divisão dos grupos para aí. Não se pode seguir um raciocínio em que existe um "pensamento burguês" ou um "pensamento proletário". A divisão em burguês e proletário não deriva do pensamento, mas do "ter". Mesmo que exista uma relação entre o "ter" e o "pensar", não é uma relação necessária.
      Os conceitos holísticos têm a utilidade de se ter uma visão do todo, mesmo para eventos sociais e humanos. Não se pode, contudo, cair na armadilha de pensar que essa homogeneidade é real, e não um mero artifício didático.

      Em discussões, deve-se tomar o cuidado de usar apropriadamente os conceitos holísticos - pelo menos se você quiser um debate justo e em busca da verdade. Criar uma divisão arbitrária como "ricos" e "pobres", fazer uma média ou uma moda de determinadas opiniões e criar um "rico médio" ou um "pobre médio" e usá-lo para criticar ou defender uma ideia é perigoso. Você pode estar atacando uma abstração que não existe e nunca existirá, e nem tem qualquer ligação com a realidade.
     A falácia do espantalho consiste em ignorar o que seu adversário diz, criar uma abstração falsa das ideias do seu adversário (a qual chamamos "espantalho") e atacar essa abstração como se estivesse atacando as ideias de seu inimigo. Você só se esqueceu que o espantalho é diferente da realidade. Você criou o espantalho como fruto de seus preconceitos.
     Muitas vezes a fonte dos preconceitos é um conceito holístico. Por exemplo, o meu adversário é da esquerda (esquerda é um conceito holístico), então ele pensa como todos os esquerdistas. Na verdade, há variabilidade de pensamento na esquerda e você o enquadrou em um espantalho que faz da esquerda.
      Normalmente os conceitos holísticos são usados com uma carga de preconceito e sem ligação com a realidade. Dizer "nação", "família", "classe", "povo", "raça" etc. é quase sempre usado de forma imprópria e desonesta. Cuidado com as generalizações.

      Vou exemplificar de uma forma bem explícita como o raciocínio holístico é perigoso:
      A maioria dos brasileiros é contrária à privatização. Logo, o povo brasileiro é contrário à privatização. José é brasileiro, logo é contrário à privatização.
      Esse exemplo é falacioso, mas cai na opinião pública de forma menos explícita. Todos passam a acreditar. Nesse momento, os argumentos e debates se erguem sobre um solo de mentiras. E a verdade é rejeitada nesse reino de inverdades como se fosse mentira. A verdade no reino da mentira é como se fosse mentira.

      Você ainda pode usar os conceitos holísticos, mas tenha em mente os problemas que surgem ao usá-los.


Tenham um bom dia!

Fontes:
http://pt.wikipedia.org/wiki/Holismo

Postagens relacionadas:
http://copaziodesaber.blogspot.com.br/2013/08/justificativas-para-nao-fazer-e-segunda.html - há uma relação com a aceitação geral de uma ideia errada.
http://copaziodesaber.blogspot.com.br/2013/12/mc-donalds-criticas-ao-capitalismo-e.html - Se critica um símbolo para se criticar o que significa, mesmo que o símbolo não seja o melhor alvo das críticas.

Indicações
Entrevista com um professor de filosofia da UFRJ, realizada pelo Instituto Ludwin Von Mises - http://www.youtube.com/watch?v=l-SNtf8TKaE

terça-feira, 14 de janeiro de 2014

"Rolezinho" e apartheid

     Tinha que estar dormindo neste momento, mas "não deixe para amanhã o que se pode fazer hoje". Que história é essa de comparar a situação com o apartheid?
     Compreenda o/a leitor/a que estou com sono e cumprindo a parte "desabafos" do blog.

     O apartheid era uma situação em que a "etnia branca" malvada discriminava a "etnia 'afrodescendente'" (ou negra). Os negros não podiam frequentar os mesmos lugares, tinham que dar preferência aos brancos etc.
     Vale lembrar que os comerciantes - brancos, negros ou cinzas - se opunham a essa divisão (exceto os comerciantes malvados que gostavam da discriminação). Explico: Os capitalistas malvados são egoístas. Eles não dão a mínima para a etnia de quem vai comprar a passagem de trem. O importante é que a pessoa pague e não incomode os outros. Com o apartheid, os capitalistas malvados tiveram que fazer um vagão a mais de forma a não manter no mesmo vagão os negros e os brancos. Eles também perdiam clientes negros se viviam em bairros de brancos, e perdiam clientes brancos se viviam em bairros negros. Bem feito para os capitalistas malvados!

     Na história do "rolezinho" - os donos dos shoppings obtiveram autorização para limitar e multar baderneiros em suas propriedades - não se iniciou com a história de separação da sociedade em dois grupos imaginários. Jovens resolveram combinar "rolezinhos" no shopping... Acabaram fazendo baderna.
     Se os jovens tivessem se comportado bem e tomado uns sovertes, ninguém iria reclamar. Acontece que se comportaram mal. Como castigo, os donos dos estabelecimentos resolveram se prevenir de outro evento semelhante.
     Vale enfatizar: Não importa se eles eram ou não pobres, o importante é que fizeram bagunça! Se tivessem ido lá para tomar um sorvete e não atrapalhassem a vida de ninguém (não congestionassem escadas rolantes, por exemplo), não haveria motivo para fazer nada contra eles.
      Os jovens se sentiram injustiçados. Eles deveriam ter o direito de criar confusão. Fazem isso em casa e nada acontece (ok, exagerei). Vítimas de um coitadismo gerado pela mistura de baixa autoestima e ignorância das normas sociais de comportamento e etiqueta, recebem apoio de uma sociedade que também os vê como coitadinhos.
     Mas pensaram qual foi o problema. Como bons coitadistas, descartaram que o problema era neles mesmos. Olhe primeiro para o outro. A culpa é sempre do outro.
     Como bons coitadistas, têm um motivo que funciona sempre para atingir o adversário e fazê-lo sentir culpa. "Minha mãe não gosta de mim", "Sou feio, você não gosta de pessoas feias", "Sou burro, os burros são desvalorizados" e outros "xingamentos" que impõem impiedosamente a si mesmo e culpam o outro por fazê-lo. Coloco entre aspas pois nem sempre são xingamentos, o importante é que a palavra faça a sociedade sentir pena.
     Tal comportamento segue o que Lênin já dizia: "Acuse os adversários do que você faz, xingue-os do que você é", o que me lembra o duplipensar (acreditar em duas ideias contraditórias ao mesmo tempo) e o "negribranco"
      Negribranco - "Aplicada a um adversário, alude ao hábito que esse adversário tem de afirmar desavergonhadamente que o negro é branco, em contradição com os fatos óbvios. Aplicada a um membro do Partido, manifesta a legal disposição de afirmar que o negro é branco sempre que a displina do Partido exigir. Mas significa ao mesmo tempo a capacidade de acreditar que o negro é branco e, mais, de saber que o negro é branco, e de esquecer que algum dia julgou o contrário" - 1984 - George Orwell.
     Ou melhor, lembra o patofalar.
     Patofalar - "Grasnar como um pato" - "Aplicada a um adversário, é um insulto; aplicada a um correligionário, é um elogio" - Certo, não se encaixa muito bem, mas a ideia é parecida.
     Enfim, os jovens coitadistas - experientes no coitadismo não obstante a idade - recorrem à divisão da sociedade por classes (seja lá como é feita essa divisão). Coitado de mim, sou da classe pobre, sou vítima da classe rica exploradora. Ai de mim, esse é o novo apartheid, devido à minha condição de berço, sou discriminado por aqueles que nasceram com dinheiro (por algum motivo, não deve haver piedade para a classe rica, embora o determinismo de classe a obrigue a agir e pensar assim). A culpa é da classe rica, ela é a culpada pela minha pobreza (seja lá por qual mecanismo), ela é totalmente discriminatória e não dá ouvidos a qualquer coisa que se fale ou argumente. A classe rica é intolerante com a classe diferente.
      Tudo bem, tenho que admitir que parte da "classe rica" (seja lá o que isso signifique) tem se pronunciado de forma intolerante. Mas também não são todos. Não é a "classe rica", são pessoas que você julga serem da "classe rica". Enquanto há pessoas dizendo "pobre não tem que ir ao shopping mesmo", há outras dizendo "coitadinho deles, eles precisam de lazer" e são da mesma "classe", OH!
      Tentei demonstrar (sinto-me tentado a colocar c.q.d. no final) que isso não é exatamente análogo ao apartheid. No apartheid, não há coitadismo, há brancos malvados. Aqui há coitadismo, há vítimas se vitimizando (só não é tautologia pois as vítimas não costuma(va)m se vitimizar, eram vitimizadas por outros).

     Falta a parte dos capitalistas malvados. É mais um complemento. Na história do "rolezinho", os capitalistas malvados têm sua propriedade invadida (caso do dono do shopping - sim, por mais estranho que pareça, o shopping tem um dono, ao contrário de uma praça pública), seus produtos subtraídos (vários produtos desapareceram durante os "rolezinhos") e seu comércio prejudicado (os vendedores e os clientes ficaram com medo; clientes tinham dificuldade de circular e entrar em lojas). O "rolezinho" não faz bem para os negócios.
     Apartheid, como disse lá em cima, faz mal para os negócios. O capitalista malvado e egoísta quer explorar o consumidor, não se preocupa se vai explorar branco ou negro (ou cinza - tá, não teve graça, já parei).
     Apartheid foi gerado por leis. Se dependesse dos capitalistas malvados, não teria sido tão segregacionista. A luta do proprietário contra o "rolezinho" não deriva de lei, deriva de um direito natural a manter a sua propriedade, é o dono quem decide quem pode entrar e o que pode fazer dentro do seu terreno. O apartheid é uma imposição que viola essa liberdade à propriedade, o governo passou a ordenar que se discriminasse mesmo envolvendo serviços e espaços particulares.
     Vou falar de novo que não são todos os capitalistas que não se importavam quem era explorado, havia aqueles que preferiam explorar os brancos.

     Tenham em mente, mais uma vez, que estou com sono e que é um desabafo. Para mim é (no futuro pode não ser) um absurdo comparar o que está acontecendo com o Apartheid (o "A" maiúsculo não é pela magnitude de suas ideias, mas pela extensão de sua maldade. Poderia ser mais apropriado um "a" minúsculo pelo valor das ideias desse nome).

Obs.: (15/01) Resolvi acrescentar essa observação para pedir desculpas a qualquer pessoa envolvida nos "rolezinhos" e que não se encaixa no perfil de coitadismo. Não deixei isso muito explícito, então peço desculpas caso alguém se sinta ofendido por aquilo que não é.


Tenham uma boa noite!

Indicação de leitura:
1984 - George Orwell

"Rolezinho" no shopping

     Imagine que você tenha uma loja de roupas. É uma loja de tamanho médio voltado para as pessoas "humildes". As portas estão sempre abertos para os clientes. Eis que um grupo de jovens brancos e de classe alta (seja lá o que isso signifique) entre e faça baderna em sua loja. Por baderna, entenda: obstruir passagens de "brincadeira", comecem a "se pegarem" e a dançar valsa entre os cabideiros.
     Você, lembrando-se de que qualquer atitude que fizer pode arruinar seu negócio, conta até dez para manter a calma e se aproxima do grupo de jovens. Você olha para aqueles olhinhos azuis e, por um instante, sente pena. Mas é só por um instante, no outro você pede para todos deixarem SUA loja. Inicialmente, eles te ignoram. Quando você ameça chamar os pais desses jovens, eles resolvem deixar o local.
      No fim do dia, você observa que várias roupas desapareceram - e não foram os clientes que compraram. Você fica com muita raiva e resolve contar até vinte, pois raiva faz mal para o coração. Mais calmo, você pensa que foi um caso isolado.
     Alguns dias depois, novamente um grupo de jovens com as mesmas características dos primeiros faz a mesma coisa em sua loja. Você resolve contar até trinta. Então ameaça chamar pais deles. Eles parecem não ligar para o que você diz. Então você ameça chamar a polícia. Eles resolvem deixar o local.
     No fim do dia, você observa que mais roupas desapareceram. Seus clientes e funcionários estão reclamando dos incidentes.
     Alguns dias depois, mais uma vez a situação se repete. Como nas historinhas a terceira vez que um evento ocorre há algo diferente, você ameaça chamar a polícia - e chama. O grupo de jovens brancos de classe alta (seja lá o que isso signifique) é espantado por armas não letais.
     No próximo dia, você consegue autorização (se é que precisa de autorização) para limitar a entrada de jovens - bem como cobrar uma multa a quem tumultuar o ambiente.
      Os jovens, ao notarem sua medida, acusam-no/na de racista contra os brancos, inimigo da classe alta (seja lá o que isso signifique), "careta" e questionam seu gosto de música e dança. Só por sua loja ter roupas voltadas para a população "humilde", você não tem o direito de impor suas medidas fascistas (?) contra eles. Você pede a opinião dos clientes e dos seus funcionários e eles aprovam a ideia, pois ficaram com medo dessa manifestação de jovens.
     Você fica sabendo que os jovens já combinaram outra ida a sua loja para criticar sua medida autoritária (?).


Se preciso, complemento com minha opinião explícita.
Tenham um bom dia!

Continuação (é mais um desabafo)
http://copaziodesaber.blogspot.com.br/2014/01/rolezinho-e-apartheid.html

domingo, 12 de janeiro de 2014

Erros comuns sobre o liberalismo político

     Já apontei que se deve ter um pé atrás ao relacionar o conservadorismo com o preconceito. - http://www.copaziodesaber.blogspot.com.br/2013/11/conservadorismo-e-preconceito.html
     Pretendo aqui apontar alguns equívocos ao se usar o termo "liberal".

1) Liberal e libertino
     Liberal não é aquele que diz que "liberou geral", que quer aproveitar os prazeres carnais sem compromisso, que é atrevido e abusado. O liberal é aquele que defende uma ampla liberdade. Essa liberdade tem restrições, como a esfera do outro. O liberal acha que cada um deve cuidar da sua vida, não interessa o que o outro faz dentro de quatro paredes, só se o que foi feito interferir em sua vida. Isso não signifique que ele não tenha nenhuma moral ou que tenha determinada moral. A adesão ao liberalismo pouco diz a respeito da vida privada do liberal.
     O liberal pode ser libertino, mas não necessariamente o é.

2) Liberal é relativista
     Liberal não é necessariamente relativista.
     O relativista moral diz que não há bom ou mau, não há cultura superior ou inferior, não há moralmente certo ou moralmente errado. Cada um acredita no que quiser, mas não há o melhor.
     O liberal pode acreditar que exista um bem, ou uma cultura superior, ou algo moralmente certo. Ele só não quer impor o seu ponto de vista aos outros - e nem que outros imponham o bem deles ao liberal. Mesmo que haja o certo e que o liberal saiba o certo, ele acha que não pode impor ao outro.

3) Liberal é 'sem opinião'
     Liberal não é necessariamente uma pessoa sem opinião.
     O liberal não diz que 'tanto faz' para um gosto de música, ou se abstém de questões políticas. Ele tem um gosto e um ponto de vista sobre arte, por exemplo, contudo não acha que seu ponto de vista deve prevalecer sobre o dos outros. O liberal defende que cada um aproveite o seus gostos, por piores que possam parecer.
     Na política, o liberal tem uma opinião bastante forte: liberdade, Estado mínimo, federalismo etc.

4 ) Liberal não critica a vida alheia
    O liberal pode criticar a vida alheia, pode falar mal, emitir opinião. Ele defende a liberdade das pessoas fazerem da vida o que quiserem, mas isso não significa que ele não possa criticar o outro. A opinião de ninguém pode obrigar a outra pessoa a agir diferente. Cada um age como bem quiser.

5) Liberdade de expressão sem limites
     Em continuação ao item acima, o liberal não necessariamente defende a liberdade de expressão sem limites. O liberal pode defender que haja um limite para a expressão de cada um. Por exemplo, pode defender que um jornal conhecido nacionalmente não possa fazer uma crítica sem qualquer fundo de verdade de um sujeito humilde que não disponha de muitos meios de se defender.

6) Liberal rejeita tudo o que é do Estado
     Os liberais costumam criticar praticamente tudo o que vem do Estado: educação, programas assistencialistas, sistema de saúde, intervencionismo, leis inúteis, órgãos de regulamentação, tributos. Contudo, a afirmação de que o liberal rejeita tudo o que é do Estado não é verdadeira, pois nem todos os liberais criticam tudo o que vem do Leviathan. Há liberais que defendam algumas leis, agências regulamentadoras, tributos, segurança, saúde, educação primária etc.
      O liberalismo prega o Estado mínimo, mas cada liberal tem sua opinião sobre o que é o mínimo.
      Só por criticar o Estado, não significa que o liberal rejeite esses aspectos. Não há, por exemplo, como rejeitar as leis  e os tributos mesmo que não se concorde com eles. Mas tomemos por exemplo a saúde. Os cidadãos são obrigados a pagar por um sistema previdenciário. Mesmo que critiquem o sistema, ainda são obrigados a pagar. Como pagam, têm o direito de receber a aposentadoria. Pior do que pagar por algo que não se quer e que é ineficaz, é pagar por isso e não receber nada. Situação análoga se aplica à saúde. Todos pagam a saúde pública, todos têm o direito a ela. O liberal costuma preferir o sistema privado, mas pode perfeitamente ir ao sistema público já que paga pelo serviço.

E extras:

7) Liberal usa argumentos econômicos. A economia é uma ciência burguesa que não se aplica ao socialismo.
      Assim como a física, a biologia, a matemática, a geografia, a economia estuda leis e princípios que são válidos em qualquer lugar em qualquer tempo. Assim, as leis econômicas são aplicáveis ao socialismo.
     Os liberais costumam ter bastantes argumentos baseados na economia já que acham que é pela economia que se pode fazer a melhor defesa do livre mercado. Os liberais defendem que a escolha entre o capitalismo e o socialismo é a escolha entre a riqueza e a pobreza, entre o ter e o não ter, e isso pelos argumentos econômicos.
     Embora a economia tenha suas leis válidas no socialismo, é impossível ser usada para estudar a realidade. É como se houvesse uma cortina preta impedindo o economista de analisar como funciona o mercado. Embora a economia funcione, não é possível estudá-la e nem fazer previsões. Ao impedir que o economista e todas as pessoas de verem o mercado, não é possível fazer boas previsões.
     O leitor interessado pode pesquisar por "impossibilidade do cálculo econômico no sistema socialista".

8) Quem critica o Bolsa Família deve se abster de bolsas de incentivo à pesquisa e ao estudo.
     A afirmação faz tanto sentido quanto "quem critica o Bolsa Paletó deve se abster das demais bolsas", ou seja, não faz sentido. Há liberais que concordam, e outros que não concordam, vou mostrar a visão daqueles que discordam da afirmação.
     A explicação é a seguinte: Quem recebe irá arcar com os custos da bolsa? Pelo menos haverá um retorno dos gastos? Na bolsa família, a pessoa pode pagar um pouco em tributos, mas não irá haver retorno do que foi gasto com ela - embora haja satisfação dessa pessoa que recebeu. Nas bolsas acadêmicas, o aluno paga em tributos o que recebeu (parcialmente ou totalmente) e retorna ao Estado com desenvolvimento de pesquisas e formação de profissionais. Na bolsa paletó, o político paga tributos, e retorna para a sociedade leis muitas vezes inúteis. Cabe à população decidir quais dessas bolsas são importantes para o país.
     Mesmo que exista uma escala para o absurdo, eu defender a bolsa paletó por determinados políticos não ganharem o bastante para ter um paletó, não significa que irei defender as bolsas científicas por achar que elas não têm o retorno esperado. Cada ideia é relativamente independente das outras.


Tenham um bom dia!

Mais:
http://veja.abril.com.br/blog/rodrigo-constantino/cultura/o-liberal-nao-precisa-ser-um-libertino-ou-um-bobalhao-sem-opiniao/

sexta-feira, 10 de janeiro de 2014

Vestibulares

Oba! Resultados do vestibular. Quero dizer, Nããão, resultados do vestibular - o que você preferir.

     Muitas pessoas que passaram em provas, concursos e vestibulares acabam dizendo para si ou para os outros que Deus é o responsável e negam o próprio papel de estudante, seja por humildade, seja por baixa auto estima.
     O que significa você passar no vestibular (aqui, me refiro a outras provas e métodos de avaliação)? Significa que a instituição que avalia por meio dessa prova considera que você está apto para ingressar no curso ao qual você concorreu - não que você realmente esteja, mas os testes avaliam que sim.
     Se você assume a total responsabilidade de sua vitória, significa que o seu nível de conhecimento e esforço foram avaliados como suficientes para o curso.
     Se você assume que a divina providência foi a responsável, significa que Deus, por algum motivo, aprova sua participação no curso. Abaixo vou desconsiderar a intervenção divina, não que não acredite nela, mas para que se possa seguir a linha de raciocínio.
     Os cursos de prestígio e importância são naturalmente mais concorridos. Mesmo que a prova seja fácil, você não está competindo contra a prova, mas contra outros candidatos. Se a prova for fácil e concorrida, muitas pessoas irão gabaritar. Por um golpe de azar ou distração, a pessoa pode errar uma soma, por exemplo, e ser eliminada - mesmo sendo melhor do que as outras. Para evitar essa situação, os cursos concorridos aplicam provas mais difíceis. Nelas, um pequeno desvio não pesa tanto.
     Tais cursos concorridos também costumam exigir mais dos alunos. Para ter sucesso neles, não basta gabaritar uma prova fácil, então é preciso de uma prova difícil que avalie conteúdos que exigem maior nível de características como inteligência, dedicação, aprofundamento.
     Acredito - e posso estar enganado - que exista uma relação, mesmo que tênue e com exceções, entre um curso concorrido e a dificuldade da prova. A instituição escolhe o método que melhor avalie as características desejadas.
     Por exemplo, instituições como a USP, Santa Casa, ITA e outros têm métodos de seleção rigorosos.
     Tudo bem que as instituições não conseguem avaliar os melhores, todos os métodos empregados podem deixar entrar um aluno menos desejável que outro aluno que não entrou. Isso acontece. A questão é: Pode uma instituição escolher um método que não acredita ser o mais apropriado?
     Um caso é a instituição permitir a entrada de um aluno cujos pais realizaram uma "doação" à instituição. O aluno pode não ser o melhor, mas a doação pode ajudar a instituição a aprimorar sua biblioteca. Há um peso entre valores e utilidades.
     Outro caso é a instituição receber incentivos ou punições que a façam seguir um método que já se sabe ser ineficiente. A situação se parece um pouco com a anterior no seguinte sentido: A instituição recebe dinheiro (ou não recebe uma punição) caso permita a entrada de aluno/s ruins. Aparentemente a moralidade nessa situação é mais fraca do que no primeiro caso, mas afeta todos os alunos que entram. Os alunos ingressantes podem simplesmente não ter as qualidades necessárias para o curso.
 
     Minha opinião é que as instituições devem ser livres para escolherem a melhor forma de ingresso sem terem que pesar "doações", incentivos fiscais ou com punições caso não adotem determinada forma de avaliação. Formas de avaliação falhas produzirão resultados falhos.
      Só para explicitar um pouco mais: Instituições respeitadas têm avaliações respeitadas para os ingressantes. Há algo muito errado quando a avaliação de entrada é obscura, falha, repleta de denúncias de vazamento da prova, sem métodos de correção explicitados claramente antes da avaliação e que cobra conteúdos de ensino fundamental quando se é preciso de um conhecimento de ensino médio. Esse problema pode ocorrer vez ou outra, mas quando um grande número de instituições apresentam esse defeito simultaneamente, há algo errado. Hamlet disse "Há algo de podre no reino da Dinamarca", mas se pode interpretar "Dinamarca" como outro lugar...

Obs.: Antes que me critiquem por usar os termos "características" e "qualidades" necessárias para determinado curso, pensem que um aluno de engenharia tem que saber matemática e física em um mínimo. Isso só é possível com dedicação, estudo e prática. Saber matemática e saber física são características e qualidades para o meu ponto de vista.


Tenham um bom dia!
Parabéns a todos os candidatos que foram aprovados no vestibular. Que a avaliação tenha sido justa e apropriada. Que Deus esteja com vocês.

segunda-feira, 6 de janeiro de 2014

[direitos] Direito à moradia = obrigação do outro?

     Algumas pessoas dizem que ter direito à moradia significa que uma pessoa tem o dever de construir uma casa para mim. Me pareceu um pouco exagerado no início, mas vamos pensar melhor?

     Vamos supor que eu tenha dinheiro o suficiente para construir uma casa antes desse direito. Surgiu esse direito. As pessoas têm o direito a moradia. Mas as casas não caem do céu, alguém precisa construí-las. Mas os trabalhadores não trabalham de graça, e os materiais não surgem sem esforço. Precisa-se de riquezas. Elas são arrecadadas dos tributos pagos. Quem paga os tributos? As próprias pessoas que receberão a moradia.
     Acontece que as pessoas que pedem a moradia não têm escolha, não podem escolher a disposição dos cômodos, a área e outras características do novo lar. Então:
     As pessoas devem ter moradia que, na verdade, elas mesmas pagam, mas é o governo que escolhe como será a moradia.

     Existe também as pessoas que já têm moradia. Sem o direito à moradia, essas pessoas não precisariam se preocupar. Mas com o direito à moradia, por força legal, todos são obrigados a colaborar, mesmo quem já tem.
     As pessoas devem ter moradia que, na verdade, elas mesmas pagam com ajuda de outras pessoas, que são obrigadas a fazê-lo. Mas nem quem recebe a casa e nem quem ajuda a pagar podem escolher como será a moradia.

     Então chegamos em um ponto interessante. Há dois tipos de pessoas:
1. Aquelas que recebem a casa. Elas pagam tributos, mas não têm amplo poder de escolha para as especificidades da casa.
2. Aquelas que pagam para os outros terem casa. Elas pagam tributos e não têm amplo poder de decisão para onde nem como será investido seu dinheiro.

     Uma pessoa que inicialmente não tem casa paga tributos que que ela tenha casa. Essa pessoa recebe uma casa paga por tributos pagos por ela mesma e por outros. Ao receber a casa a pessoa continua pagando tributos, que serão usados para pagar casas para outros. Em nenhum momento a pessoa tem amplo poder de escolha para o modelo da casa nem pode optar pagar ou não o tributo.

Conclusão
     Me parece evidente, e me perdoem os gramáticos pelo uso indevido de próclise, que a medida não faz tanto sentido. Também vejo que, se o direito à moradia deve ser cumprido pelo governo, alguém terá que arcar com os custos da construção da casa, e esse ônus será de todos, mas eu acabarei tendo que pagá-lo ou integralmente ou quase integralmente.
     Acredito que o direito à moradia e outros devem ser frutos do esforço e do trabalho individual, e não um direito que se possa exigir de alguém ou do governo se não se fez nada para merecê-lo.

Soluções
     A falta de moradia ainda é um problema. Mas a moradia é um direito?
     A moradia nos termos tratados não é um direito natural, as pessoas conseguem sobreviver sem moradia e ela não é inerente à natureza humana. Ela pode ser um direito positivo, posto pelo Leviathan, o que levaria aos problemas apresentados acima.
     Mesmo assim, acho que continua sendo um problema. Tal problema só poderia ser resolvido de forma justa se quem arcar com os custos for exclusivamente aquele que obterá a propriedade (outros podem ajudar, mas de movo livre e voluntário).
1 - Programas de financiamento de casa. O governo ou bancos ou outras organizações compram ou constroem casas e financia elas para as pessoas interessadas. Para que essas entidades se interessem, um lucro sobre o valor pago e muitas prestações para diminuir a densidade das dívidas (acabei de inventar o termo).
2 - Proponho a diminuição de tributos para apartamentos e outras formas de moradias verticais. Isso diminuiria o custo para as famílias que nelas moram e possibilitaria maior interesse de investidores.
     Há outras medidas, mas têm efeitos indiretos, sendo muito longo e cansativo falar sobre elas aqui. Ao meu ver a falta de moradia é uma consequência de desventuras que o país vive. Devemos atacar causas estruturais, muito relacionadas com a política, a economia e a cultura. Mas isso fica para outro dia,

sexta-feira, 3 de janeiro de 2014

Independência

     Na ceia de Natal, minha família conversava sobre várias coisas. Um dos pontos que me chamou atenção foram músicas - de pessoas mais pobres - que criticavam a ostentação, o capitalismo malvado. Comecei a me perguntar se essa preocupação com o "ter" infecta mais os ricos ou os pobres. Pertenço a uma classe média-alta (embora não goste muito dessa separação de classes), mas minha família não liga muito para isso. Enquanto isso, há músicas de pessoas pobres criticando, relatos de pobres que roubam só coisas de marca etc. Penso que essa forma de valoração está presente em cada parte da sociedade.

     O jovem quer ser independente. Quer viver sem ajuda financeira dos pais. O jovem quer ter sua própria casa, seu próprio carro, pagar suas próprias despesas. O jovem quer ter seu próprio dinheiro e gastá-lo sem dar satisfação a ninguém. O jovem quer ter sua própria renda.
     Se costuma sempre pensar na autonomia financeira, mas bem menos são os que se preocupam com a autonomia intelectual, cultural, ideológica.
     Quantos jovens procuram sua própria fonte de renda intelectual? Quais criticam os próprios "duplipensamentos"? Quem busca ser independente à ideologia dos pais (independente não significa discordância)? Quem tenta compreender como o outro pensa?
     Esses jovens criticam aqueles que pensam diferente pelo pensamento do outro ter paradoxos, segundo os primeiros. Na verdade, há uma falta de compreensão e uma falta de autocrítica: quem critica o outro não critica a si mesmo, e carrega um conjunto de crenças que, em análise profunda, são contraditórias.
     As pessoas estão presas em um mundo materialista, o que importa é o que tem, e não o que pensa. Como se independesse a cultura, só a posse.
     O vírus materialista infecta todas as pessoas, não importa quanto a pessoa têm, qualquer um pode ser vítima desse pensamento - não há diferença de riqueza, um pobre pode valorizar o material mais do que um rico (há ricos pouco encanados com isso). E começa a valorizar as posses e as marcas mais do que a personalidade e os valores.
     Ricos se tornam esnobes ou valorizam uns aos outros pela marca de roupa. Os pobres roubam pela marca, não pela necessidade. - "ricos" e "pobres" no parágrafo são generalizações infelizes.
     As pessoas devem buscar uma independência não financeira, mas psicológica e cultural. A pessoa tem que valorizar a si mesmo - a vida é milhares de vezes mais preciosa do que a posse. Devemos buscar o amadurecimento cultural, aceitar críticas sem reagir como adolescentes mimados. Buscar os próprios valores e objetivos, que frutificam em uma mentalidade autossuficiente.


Tenham um bom dia!

Indicação de leitura:
"Esquerda Caviar" - Rodrigo Constantino