domingo, 12 de janeiro de 2014

Erros comuns sobre o liberalismo político

     Já apontei que se deve ter um pé atrás ao relacionar o conservadorismo com o preconceito. - http://www.copaziodesaber.blogspot.com.br/2013/11/conservadorismo-e-preconceito.html
     Pretendo aqui apontar alguns equívocos ao se usar o termo "liberal".

1) Liberal e libertino
     Liberal não é aquele que diz que "liberou geral", que quer aproveitar os prazeres carnais sem compromisso, que é atrevido e abusado. O liberal é aquele que defende uma ampla liberdade. Essa liberdade tem restrições, como a esfera do outro. O liberal acha que cada um deve cuidar da sua vida, não interessa o que o outro faz dentro de quatro paredes, só se o que foi feito interferir em sua vida. Isso não signifique que ele não tenha nenhuma moral ou que tenha determinada moral. A adesão ao liberalismo pouco diz a respeito da vida privada do liberal.
     O liberal pode ser libertino, mas não necessariamente o é.

2) Liberal é relativista
     Liberal não é necessariamente relativista.
     O relativista moral diz que não há bom ou mau, não há cultura superior ou inferior, não há moralmente certo ou moralmente errado. Cada um acredita no que quiser, mas não há o melhor.
     O liberal pode acreditar que exista um bem, ou uma cultura superior, ou algo moralmente certo. Ele só não quer impor o seu ponto de vista aos outros - e nem que outros imponham o bem deles ao liberal. Mesmo que haja o certo e que o liberal saiba o certo, ele acha que não pode impor ao outro.

3) Liberal é 'sem opinião'
     Liberal não é necessariamente uma pessoa sem opinião.
     O liberal não diz que 'tanto faz' para um gosto de música, ou se abstém de questões políticas. Ele tem um gosto e um ponto de vista sobre arte, por exemplo, contudo não acha que seu ponto de vista deve prevalecer sobre o dos outros. O liberal defende que cada um aproveite o seus gostos, por piores que possam parecer.
     Na política, o liberal tem uma opinião bastante forte: liberdade, Estado mínimo, federalismo etc.

4 ) Liberal não critica a vida alheia
    O liberal pode criticar a vida alheia, pode falar mal, emitir opinião. Ele defende a liberdade das pessoas fazerem da vida o que quiserem, mas isso não significa que ele não possa criticar o outro. A opinião de ninguém pode obrigar a outra pessoa a agir diferente. Cada um age como bem quiser.

5) Liberdade de expressão sem limites
     Em continuação ao item acima, o liberal não necessariamente defende a liberdade de expressão sem limites. O liberal pode defender que haja um limite para a expressão de cada um. Por exemplo, pode defender que um jornal conhecido nacionalmente não possa fazer uma crítica sem qualquer fundo de verdade de um sujeito humilde que não disponha de muitos meios de se defender.

6) Liberal rejeita tudo o que é do Estado
     Os liberais costumam criticar praticamente tudo o que vem do Estado: educação, programas assistencialistas, sistema de saúde, intervencionismo, leis inúteis, órgãos de regulamentação, tributos. Contudo, a afirmação de que o liberal rejeita tudo o que é do Estado não é verdadeira, pois nem todos os liberais criticam tudo o que vem do Leviathan. Há liberais que defendam algumas leis, agências regulamentadoras, tributos, segurança, saúde, educação primária etc.
      O liberalismo prega o Estado mínimo, mas cada liberal tem sua opinião sobre o que é o mínimo.
      Só por criticar o Estado, não significa que o liberal rejeite esses aspectos. Não há, por exemplo, como rejeitar as leis  e os tributos mesmo que não se concorde com eles. Mas tomemos por exemplo a saúde. Os cidadãos são obrigados a pagar por um sistema previdenciário. Mesmo que critiquem o sistema, ainda são obrigados a pagar. Como pagam, têm o direito de receber a aposentadoria. Pior do que pagar por algo que não se quer e que é ineficaz, é pagar por isso e não receber nada. Situação análoga se aplica à saúde. Todos pagam a saúde pública, todos têm o direito a ela. O liberal costuma preferir o sistema privado, mas pode perfeitamente ir ao sistema público já que paga pelo serviço.

E extras:

7) Liberal usa argumentos econômicos. A economia é uma ciência burguesa que não se aplica ao socialismo.
      Assim como a física, a biologia, a matemática, a geografia, a economia estuda leis e princípios que são válidos em qualquer lugar em qualquer tempo. Assim, as leis econômicas são aplicáveis ao socialismo.
     Os liberais costumam ter bastantes argumentos baseados na economia já que acham que é pela economia que se pode fazer a melhor defesa do livre mercado. Os liberais defendem que a escolha entre o capitalismo e o socialismo é a escolha entre a riqueza e a pobreza, entre o ter e o não ter, e isso pelos argumentos econômicos.
     Embora a economia tenha suas leis válidas no socialismo, é impossível ser usada para estudar a realidade. É como se houvesse uma cortina preta impedindo o economista de analisar como funciona o mercado. Embora a economia funcione, não é possível estudá-la e nem fazer previsões. Ao impedir que o economista e todas as pessoas de verem o mercado, não é possível fazer boas previsões.
     O leitor interessado pode pesquisar por "impossibilidade do cálculo econômico no sistema socialista".

8) Quem critica o Bolsa Família deve se abster de bolsas de incentivo à pesquisa e ao estudo.
     A afirmação faz tanto sentido quanto "quem critica o Bolsa Paletó deve se abster das demais bolsas", ou seja, não faz sentido. Há liberais que concordam, e outros que não concordam, vou mostrar a visão daqueles que discordam da afirmação.
     A explicação é a seguinte: Quem recebe irá arcar com os custos da bolsa? Pelo menos haverá um retorno dos gastos? Na bolsa família, a pessoa pode pagar um pouco em tributos, mas não irá haver retorno do que foi gasto com ela - embora haja satisfação dessa pessoa que recebeu. Nas bolsas acadêmicas, o aluno paga em tributos o que recebeu (parcialmente ou totalmente) e retorna ao Estado com desenvolvimento de pesquisas e formação de profissionais. Na bolsa paletó, o político paga tributos, e retorna para a sociedade leis muitas vezes inúteis. Cabe à população decidir quais dessas bolsas são importantes para o país.
     Mesmo que exista uma escala para o absurdo, eu defender a bolsa paletó por determinados políticos não ganharem o bastante para ter um paletó, não significa que irei defender as bolsas científicas por achar que elas não têm o retorno esperado. Cada ideia é relativamente independente das outras.


Tenham um bom dia!

Mais:
http://veja.abril.com.br/blog/rodrigo-constantino/cultura/o-liberal-nao-precisa-ser-um-libertino-ou-um-bobalhao-sem-opiniao/

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